quinta-feira, 29 de março de 2012

Brasil paga 'alto preço ecológico' pelo crescimento


Índia e Brasil estão pagando um "alto preço" ecológico por conta de seu rápido crescimento econômico nos últimos anos, afirmaram nesta quarta-feira, 28, alguns analistas em meio ambiente, que estão reunidos em Londres na conferência Planet Under Pressure.



Entre 1990 e 2008, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita do Brasil aumentou 34% e o da Índia 120%, um resultado que pode ser tendencioso, afirmaram os cientistas e economistas reunidos. A convenção de Londres é um encontro prévio à Rio+20, cúpula das Nações Unidas, que será realizada no mês de junho, no Rio de Janeiro.
Mas em contraste com a renda per capita, o "capital natural" de ambos os países, que inclui todos seus "ativos" - desde florestas até combustíveis fósseis e minerais -, foi reduzido neste mesmo período 46% no Brasil e 31% na Índia.
No terceiro dia do encontro mundial sobre ecologia, os analistas propuseram uma medida alternativa ao PIB, batizada como Índice de Riqueza Detalhado, que compreende o "capital natural, humano e manufaturado" do país. De acordo com esse índice, o Brasil e a Índia, supostamente duas das economias emergentes mais potentes do planeta, cresceram apenas 3% e 9%, respectivamente, em 18 anos.
"Os casos do Brasil e da Índia ilustram como o Produto Interno Bruto pode ser impreciso como índice para avaliar o progresso econômico a longo prazo", apontou o professor da Universidade das Nações Unidas (UNU) Anantha Duraiappah.
O economista ressaltou que "um país pode extinguir totalmente seus recursos naturais e registrar ao mesmo tempo um crescimento do PIB" e, por isso, defendeu a necessidade de priorizar um indicador que compreenda todos os aspectos necessários para o "bem-estar humano", incluindo os fatores sociais e ecológicos.
Duraiappah adiantou que durante a cúpula do Rio de Janeiro será apresentado pela primeira vez os dados sobre a Riqueza Detalhada de 20 países, entre Chile, Colômbia, Equador, Venezuela, Alemanha, Japão, Rússia e Estados Unidos, além da própria Índia e do Brasil.
"Até que os indicadores usados para medir o progresso mudem para poder avaliar a sustentabilidade a longo prazo, o planeta e seus habitantes continuarão sofrendo o peso de políticas de crescimento de curto alcance", declarou Pablo Muñoz, diretor cientista do grupo de trabalho que desenvolverá os índices de Riqueza Detalhada.
Yvo de Boer, o antigo responsável do Painel Intergovernamental para a Mudança Climática das Nações Unidas, ressaltou que o setor privado deve adaptar seu modelo de negócio aos desafios que serão apresentados nas próximas décadas.
"A escassez sem precedentes de recursos naturais, a alta do preço dos alimentos, os problemas de segurança energética e o crescimento da população, que deverá alcançar os 10 bilhões em 2100, são os principais desafios para a economia global", aponta De Boer. O especialista em mudança climática afirmou que, se as companhias tivessem que pagar o custo ambiental de suas atividades, teriam perdido 41% de seus lucros em 2010.



 site do Estadão

terça-feira, 27 de março de 2012

Probabilidade de madeireiro ilegal ser punido no Brasil é inferior a 1%

A corrupção em cargos elevados e a falta da aplicação da lei florestal fomentam o mercado de extração ilegal de madeira no Brasil. Essa conclusão é detalhada no relatório do Banco Mundial intitulado Justiça para as Florestas: Melhoria dos Esforços da Justiça Criminal para Combater a Extração Ilegal de Madeira, divulgado nesta semana.


De acordo com o estudo, que teve duração de quatro anos, a probabilidade de um madeireiro ilegal ser penalizado no Brasil e em outros três países (México, Indonésia e Filipinas) é menor que 0,08%. “Precisamos combater o crime organizado na extração ilegal, da mesma forma como vamos atrás de bandidos organizados que vendem drogas ou de organizações criminosas”, sugere o gerente da equipe do Banco Mundial encarregada da integridade dos mercados financeiros, Jean Pesme.

Além disso, o documento afirma haver uma “confusão jurisdicional” no Brasil. Conforme o estudo, atores responsáveis pela aplicação da legislação florestal, como juízes, guardas florestais e investigadores criminais, não cooperam entre si de forma correta. “Se cada uma dessas partes tivesse uma apreciação mais detalhada do papel dos outros jogadores, a cooperação, sem dúvida, melhoraria, ajudando a remover um dos principais obstáculos à condenação: falhas de comunicação entre as várias partes do sistema”, afirma o relatório.

O levantamento cita casos de corrupção no Brasil envolvendo administradores locais e funcionários do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). “Operações gigantes de extração ilegal da madeira causaram um dano estimado em 500 milhões de dólares para a Floresta Amazônica”, observa o documento, sobre um caso de 2010.

Apesar dos problemas, o relatório lembra, ao citar o papel de ONGs no combate ao comércio ilegal de madeira, a bem sucedida parceria do Greenpeace com o Ibama. Em 2000, durante uma inspeção de cinco dias, a organização e a agência brasileira apreenderam o maior volume de toras de mogno, orçado em 7 milhões de dólares.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Manejo ruim avança na floresta


Os números do Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram uma contínua redução da taxa de desmatamento na Amazônia. Entre 2004 e 2011, a destruição anual diminuiu de 27,7 mil para 7 mil quilômetros quadrados. O cenário de queda é apresentado pelo governo brasileiro como trunfo nas negociações internacionais sobre clima. Mas um novo estudo do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), que será divulgado em abril, revela uma realidade nem sempre detectada pela varredura com imagens de satélite que gera os dados oficiais: embora o desmate seja decrescente quando se analisa a abertura de grandes áreas na mata pelo chamado “corte raso”, a degradação florestal causada pela extração seletiva de árvores em planos de manejo de má qualidade, executados sem critérios ambientais, é cada vez maior.



No relatório “Transparência Manejo Florestal”, com dados sobre a produção madeireira de Mato Grosso, os pesquisadores concluíram que a exploração de baixa qualidade aumentou de 71 mil para 80 mil hectares entre agosto de 2010 e julho de 2009, quando comparada ao mesmo período do ano anterior. Ao mesmo tempo, as áreas consideradas tecnicamente de bom nível diminuíram de 12 mil para 7 mil hectares. No caso da exploração de qualidade intermediária, a redução foi mais expressiva, em torno de 40%. A pesquisa cruzou informações do licenciamento para o manejo florestal e outros mecanismos de controle do governo estadual com imagens de satélite do Sistema de Monitoramento da Exploração Madeireira (Simex), desenvolvido pelo Imazon.
“A tendência dos impactos e outros problemas com o corte de árvores a partir de planos de manejo autorizados pelo governo permaneceu em 2011 e também no começo de 2012, em função da expectativa com a possível anistia ao desmatamento proposta na reforma do Código Florestal”, analisa André Monteiro, coordenador do estudo, financiado pelo Fundo Vale e USAID (EUA). O pesquisador lembra que o aumento do manejo sem critérios também está relacionado ao zoneamento socioeconômico e ecológico de Mato Grosso, que foi sancionado em abril do ano passado pelo governo estadual prevendo redução de áreas protegidas nas propriedades, mas acabou impugnado pela Justiça. Em março e abril de 2011, segundo o INPE, o Estado perdeu 480 quilômetros quadrados de floresta – 80% do desmatamento total da Amazônia para o período.
Segundo o Imazon, a exploração de madeira ilegal cresceu 84% no Mato Grosso entre 2009 e 2010. Além do problema da baixa qualidade no trato com as áreas autorizadas para manejo, 44% da floresta explorada não teve autorização do órgão ambiental estadual. A maior parte da retirada de madeira sem permissão aconteceu em áreas privadas, devolutas ou sob disputa. Na Região Amazônica como um todo, a madeira ilegal corresponde a um terço da produção total, conforme o estudo “Fatos Florestais da Amazônia/2010″, do Imazon.
“No Mato Grosso, a exploração ilegal aumenta porque as ações de fiscalização do governo se concentram apenas em área de desmatamento recente de corte raso, que abre grandes clareiras na mata”, adverte Monteiro. Ele recomenda: “É preciso agir nas regiões onde o corte seletivo ilegal está acontecendo, pois essa é a atividade que abre caminho, através da construção de estradas, para o desmatamento em maior escala”.
O principal problema, diz ele, está na ação “formiguinha” que destrói a floresta com base em documentação legal. O estudo detectou que 98% das Autorização de Exploração Florestal (Autex), que são emitidas pelo governo e funcionam como uma licença para o aproveitamento de madeira, estavam regulares. Em 2010, foram liberados 3,3 milhões de metros cúbicos de madeira em tora, no Mato Grosso. Houve redução significativa nos casos de comercialização de madeira acima do autorizado pelo sistema de controle, mas os pesquisadores detectaram planos de manejo sobrepondo reservas e outras áreas protegidas e regiões desmatadas antes da permissão.
A Secretaria de Meio Ambiente do Mato Grosso – embora parceira no estudo do Imazon — não quis comentar os resultados do estudo. “A madeira é nosso negócio e precisamos manter a floresta viva”, afirma Álvaro Leite, diretor do Centro das Indústrias Produtoras e Exportadoras de Madeira. A entidade empresarial apóia o órgão ambiental no treinamento e aquisição de equipamentos para controle do manejo florestal por imagem de satélite, em tempo real. “Não nos interessa a prática de degradação”, diz Leite. O Mato Grosso tem 2,6 milhões de hectares sob produção de madeira – área equivalente ao tamanho de Alagoas.
Segundo o Imazon, 12% da exploração ilegal está dentro de unidades de conservação ou terras indígenas, como a Manoki, a de maior devastação, onde foram derrubados 5,7 mil hectares. Entre os municípios, Nova Maringá – onde a soja avança – apresentou o maior índice de problemas, somando mais de 17 mil hectares de floresta explorada sem autorização. Em janeiro, o Ibama aplicou R$ 1 milhão em multas durante a Operação Toruk, que detectou desmatamento na região do município de Sinop, a 503 km de Cuiabá.
Madeira ilegal é 50% mais barata
“O manejo avançou no país, tanto sob o ponto de vista técnico como de extensão de áreas exploradas, mas falta capacitação de toda a cadeia para a melhoria da qualidade e cumprimento das normas”, diz Antônio Carlos Hummel, diretor do Serviço Florestal Brasileiro. Ele aponta o modelo de concessões de florestas públicas à exploração privada de madeira por meio do manejo como uma referência que pode influenciar o mercado a dar escala ao fornecimento de produto legal. A meta do governo é lançar editais para a concessão de 2 milhões de hectares de florestas até 2014. Em 2012, deverão ser lançados editais para quatro florestas nacionais – Jacundá (RO), Amaná (PA), Crepori (PA) e Saracá-taquera II (PA), no total de 719 mil hectares. “O modelo avança, mas em ritmo mais lento do que imaginávamos”, diz Humel, ressaltando que “o arranjo institucional do governo federal para a gestão das florestas precisa ser melhorado”.
“Estamos substituindo desmatamento por degradação da floresta”, afirma Roberto Waack, diretor da empresa Amata, gestora da primeira e única concessão florestal em operação no país, na Floresta Nacional do Jamari (RO). Respaldada por documentos, a madeira obtida por métodos predatórios tem “aparência” legal e compete em situação vantajosa com quem produz dentro da legalidade. “Planos de manejo aprovados para a retirada de até 25 metros cúbicos por hectare extraem o dobro e esgotam a madeira nobre. Os custos operacionais da produção ilegal são 50% inferiores aos do produto legal”, revela Waack.
Por: Sergio Adeodato
Fonte: Valor Econômico 

terça-feira, 20 de março de 2012

Código Florestal, utopia ou loucura?


Só um indivíduo socialmente irresponsável seria contra a possibilidade de o Brasil reverter, num período de tempo plausível, os erros graves cometidos no seu processo de ocupação territorial. Querer resolver esses problemas numa patada, com um golpe de força, é ignorar o processo histórico, suas circunstâncias e criar um ambiente propício para toda ordem de conflitos.




A versão do Senado para o Código Florestal prevê a recuperação de áreas de preservação permanente (APPs) em todas as propriedades rurais. Quem defende esse dispositivo está praticamente condenando à morte 4,5 milhões de pequenos agricultores, responsáveis por mais da metade da produção de alimentos no País, e colocando uma bomba no colo da presidente Dilma Rousseff. E está fazendo isso premido por argumentos e campanhas que muitas vezes se sustentam mais por argumentos emocionais do que racionais; não é possível reverter 500 anos de um processo econômico com um decreto.

No final do século passado, foram consideradas APPs as faixas marginais dos rios, as encostas de morros e outras situações. Mas a ocupação desses locais já ocorrera, ao longo dos nossos 500 anos de História. Os principais exemplos são as pastagens nas montanhas de Minas Gerais, como ocorre nos Alpes e nos Andes; os vinhedos e macieiras em encostas do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, como em grande parte da Europa; o café em altitude em São Paulo e Minas Gerais, como na Colômbia; os bananais no Vale do Ribeira, como no Equador; e a ocupação de várzeas e terras férteis à margem de rios com plantios de arroz, irrigação, criação de búfalos e outras atividades, como no Nilo, no Mekong, etc.

Na versão aprovada na Câmara dos Deputados, as atividades agropecuárias tradicionais, desenvolvidas até 2008 em APPs, seriam consolidadas, com a proibição de abertura de novas áreas. Mas o Senado impôs mais uma condição: os agricultores devem arrancar cultivos e pomares, retirar o gado e recuperar a vegetação nativa em faixas de 15 até 500 metros de cada lado dos rios e riachos. Ao longo do Rio São Francisco ou de rios de Mato Grosso, por exemplo, isso pode representar a perda de mais da metade das áreas produtivas. Para quem tem diversos riachos na propriedade pode inviabilizar toda a produção. É também o caso dos projetos de irrigação, instalados ao lado dos rios.

A proposta, portanto, é de que o Estado imponha essa perda agrícola e ainda transfira o ônus para os agricultores: uma utopia ou loucura, dependendo da sua perspectiva. Segundo fontes do Ministério do Meio Ambiente, a agricultura perderia 33 milhões de hectares. Para outras fontes, isso representaria arrancar cultivos, pomares e pastagens de 60 milhões de hectares.

Quanto menor a propriedade rural, pior a sua situação. Os pequenos utilizam a totalidade das terras para produzir e sobreviver. De acordo com a Lei n.º 8.629/93, pequenas propriedades são imóveis entre um e quatro módulos fiscais (MFs), cuja dimensão é definida pelo Incra para cada município.

Em parte do Brasil, o Senado propõe que essa perda de terras produtivas se limite ao máximo de 20% da propriedade com menos de quatro MFs. Ora, ao longo dos rios estão os terrenos mais férteis. Na maioria dos casos, esses 20% de terras férteis garantem 50% a 80% da renda do produtor.

Um estudo da Embrapa Gestão Territorial verificou, com base no Incra e no Censo Agropecuário do IBGE de 2006, que os imóveis com até quatro MFs correspondem a 89% dos estabelecimentos agropecuários do País, ocupam 11% do território e contribuem com 50% da produção agropecuária. Eles serão duramente atingidos por essa medida, cujo alcance social e econômico o Ministério do Meio Ambiente e o governo não dimensionaram, muito menos o Senado.

Como impor indiscriminadamente a recomposição com vegetação nativa de áreas produtivas, se elas foram ocupadas em conformidade com a lei de seu tempo? O ministro Marco Aurélio Mello, do STF, já prevê uma enxurrada de ações judiciais. Se não é uma enorme irresponsabilidade defender tal medida, é uma tentativa de passar a borracha na nossa História e em alguns casos levar a fatura para quem não tem nenhuma responsabilidade sobre esse passado.

Áreas de preservação permanente devem ser recuperadas quando e onde for pertinente, e todos os esforços nesse sentido são bem-vindos. Mas exigir a mesma faixa de vegetação para um riacho que corre dois meses na caatinga, ou desce encachoeirado as serras do Espírito Santo, ou escoa quase imperceptível pela pampa gaúcha, ou forma um pequeno igarapé na Amazônia é ignorar a diversidade do meio ambiente. Cada bioma pede critérios específicos. Os Estados devem participar da avaliação e do esforço para recompor as APPs de forma adequada, considerando a ocupação das terras, as tecnologias empregadas, a situação de conservação dos solos e das águas e, mais do que tudo, a história de como isso ocorreu, num processo secular.

A regularização das atividades econômicas produtivas até 2008 em APPs dará segurança jurídica ao homem do campo. O princípio da precaução sugere que o governo avalie a situação das APPs e só depois proponha sua recuperação, por meio de critérios técnicos, lá onde for necessário, de forma adequada e no tempo possível. Forçar a recomposição como regra absoluta pode quebrar a agricultura e os agricultores, além de abalar profundamente um dos setores mais desenvolvido e dinâmico da economia do Brasil.

Vale lembrar de novo que o objetivo das leis é apoiar a sociedade, e não controlar a sociedade. São dinâmicas, evoluem com ela, contribuindo para a formação do arcabouço institucional. Quando as estruturas legais se chocam com as estruturas sociais, elas criam as condições para conflitos sem fim.
 


Fonte: O Estado de S.Paulo


segunda-feira, 19 de março de 2012

MP pede suspensão do licenciamento e obras da usina de Teles Pires


Apesar de o projeto impactar agressivamente as fontes de sobrevivência socioeconômica e cultural indígena, Constituição foi ignorada
O Ministério Público do Estado do Mato Grosso (MP/MT), o Ministério Público Federal no Pará (MPF/PA) e no MT (MPF/MT) ajuizaram na última sexta-feira, 16 de março, a quarta ação por irregularidades no licenciamento ambiental da usina hidrelétrica de Teles Pires, uma das seis barragens previstas para o rio de mesmo nome, que fica entre os dois Estados.
Os procuradores da República e promotores de Justiça autores da ação pedem que a Justiça determine ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e à Empresa de Pesquisa Energética (EPE) a suspensão imediata do licenciamento e das obras da usina. O motivo é o não cumprimento da determinação constitucional que obriga a realização de consulta livre, prévia e informada dos povos indígenas afetados.
Apesar de o projeto impactar de forma direta e agressiva as fontes de sobrevivência socioeconômica e cultural dos povos Kayabi, Munduruku e Apiaká, as comunidades não foram ouvidas.
Além de violar o artigo 231 da Constituição e diversas convenções internacionais das quais o Brasil é signatário, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, a não realização da consulta desobedece vasta jurisprudência do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, alerta o MP.
“Considerando-se que a política energética atual do estado brasileiro para a Amazônia compreende a produção de energia a partir do barramento dos rios, o direito à consulta, conforme estabelecido na Constituição e na Convenção 169 merece relevo, na medida em que sua efetivação pelo poder público é obrigatória nesse contexto e é condição para a segurança das comunidades e livre exercício dos direitos humanos e fundamentais daqueles povos indígenas cujo modo de vida inerente ao rio passa a ser ameaçado por usinas hidrelétricas”, afirma o texto da ação assinada pelos promotores de Justiça Hellen Uliam Kuriki e Luciano Martins da Silva (MP/MT) e pelos procuradores da República Felício Pontes Jr. (MPF/PA) e Márcia Brandão Zollinger (MPF/MT).
Falhas e impactos brutais – As três primeiras ações do MP já haviam apontado falhas graves no processo de licenciamento (estudos ambientais incompletos, problemas nas audiências públicas e a não realização de ações obrigatórias que poderiam reduzir os impactos da obra), mas mesmo assim o Ibama concedeu a licença de instalação, em 19 de agosto do ano passado. Quatro dias depois as obras foram iniciadas pelo consórcio construtor, formado por Odebrecht Energia, Voith Hydro e Alstom.
A ação do MP ressalta dados que mostram a existência de danos iminentes e irreversíveis para a qualidade de vida e patrimônio cultural dos povos indígenas da região. Dentre eles está, por exemplo, a inundação das corredeiras de Sete Quedas, berçário natural de diversas espécies de peixes. “As cachoeiras de Sete Quedas, que ficariam inundadas pela barragem, são o lugar de desova de peixes que são muito importantes para nós, como o pintado, pacu, pirarara e matrinxã”, registra texto de um manifesto indígena citado na ação.
Além da sobrevivência física, Sete Quedas é fundamental para a sobrevivência cultural dos povos indígenas. Para eles, é uma área sagrada, relevante para suas crenças, costumes, tradições, simbologia e espiritualidade. Como patrimônio cultural brasileiro, é um bem protegido pela Constituição, destacam os procuradores da República e promotores de Justiça, que citam, ainda, normas internacionais de proteção ao patrimônio cultural imaterial.
Outras ameaças à vida indígena citadas pelo MP são os iminentes conflitos gerados pelo aumento do fluxo migratório na região, como a especulação fundiária, desmatamento ilegal, pesca predatória e exploração ilegal de recursos minerais. Como a demarcação de uma das Terras Indígenas, a Kayabi, está pendente há quase 20 anos, essas ameaças são ainda maiores, diz o MP.
Fonte: Ministério Público Federal no Pará

terça-feira, 6 de março de 2012

Código Florestal: A disputa entre a competitividade e a ganância Código Florestal: A disputa entre a competitividade e a ganância

Ao pressionar por mudanças no Código Florestal Brasileiro o agronegócio, que vem demonstrando uma fantástica capacidade de inovar e crescer, se apequena em defesa de ilegalidades e ganância.
 
O Código Florestal retorna à pauta da Câmara Federal esta semana e novamente coloca de frente argumentos em defesa da “produtividade” do setor agropecuário em contrapartida à necessidade defendida por cientistas e ambientalistas de se proteger pedaços de biomas naturais em propriedades agrícolas, conhecidos como Áreas de Preservação Permanente (APP) e Áreas de Reserva Legal (ARL). 


Com a manutenção do Código Florestal Brasileiro de 1966 o agronegócio brasileiro perderá sua competitividade? Foto Rodrigo Baleia/ AE
 
No último ano esses termos entraram no vocabulário dos brasileiros, que em sua maioria já sabe o que significa.
 
No entanto, uma questão foi pouco tratada neste tempo todo de discussão. Com a manutenção do Código Florestal Brasileiro de 1966 o agronegócio brasileiro perderá sua competitividade? Segundo dados do Ministério da Agricultura e Pecuária o setor exportava 20,6 bilhões de dólares em 2000; em 2008, chegou a 69,4 bilhões em vendas ao exterior e, em 2011 pulou para 94,59 bilhões de dólares em exportações. O resultado de 2011 foi quase 25% maior que em 2010 quando o setor do agronegócio despachou pelos portos do país 76,4 bilhões de dólares.
 
Um estudo realizado pela Unctad (Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento) realizado em 2006 projetava a transformação do agronegócio brasileiro em um dos mais fortes do mundo em 10 anos.
 
Hoje os números do setor mostram que o Brasil está atrás apenas dos Estados Unidos e da União Europeia em termos de produção e vendas, já ocupando posição de liderança em alguns produtos, como açúcar, café, carne bovina e frango, mas tem posição de destaque também em soja, milho e outras commodities agrícolas.
 
Em termos de área disponível o Brasil conta com mais de 200 milhões de hectares de áreas que não se enquadram em nenhum tipo de restrição para uso agrícola, podendo chegar a quase 300 milhões, segundo publicou em seu blog o economista José Roberto Mendonça de Barros, e apenas 64 milhões de hectares estão sendo utilizados para a produção de 190 milhões de toneladas de grãos.
 
Todos esses números servem para mostrar apenas que o setor do agronegócio, que atualmente é controlado por um punhado de empresas, não tem nenhum problema em se manter competitivo diante do mercado internacional.
 
Atualmente, segundo dados levantados pelo jornalista Aldem Bourscheit, do WWF, sete em cada dez quilos de soja produzida no Brasil são processados por apenas nove empresas, e destas cinco são transnacionais: ADM (Estados Unidos), Cargill (Estados Unidos), Bunge (Holanda), Louis Dreyfus (França) e Grupo Noble (Cingapura).
 
Outro ponto que deve ser apontado e que vem sendo lembrado por especialistas ambientais e cientistas é que o avanço do agronegócio sobre novas áreas resulta em mais demanda por infraestrutura, estradas e portos em regiões onde normalmente não seriam necessárias, principalmente porque não são demandas da população local. Um exemplo disso é o porto para o embarque de soja construído em Santarém, no Pará, cuja licença ambiental é até hoje objeto de dúvidas.
 
O projeto que altera o Código Florestal, e que será apreciado pelos deputados federais, foi construído à revelia da opinião e participação dos principais centros de pesquisa científica do Brasil, como as universidades e a Associação Brasileiro para o Progresso da Ciência, que teve seus estudos rechaçados pelo antigo relator do código e atual ministro dos Esportes, Aldo Rebello.
 
O ponto que mais desperta indignação é o perdão de crimes ambientais cometidos contra o atual Código Florestal, com a anistia a desmatadores. É sempre bom lembrar que não anistiar sonegadores e criminosos foi uma das promessas de campanha da presidenta Dilma Rousseff, e que mesmo se o Código Florestal for descaracterizado pelos deputados, mantém a prerrogativa de vetar os pontos mais devastadores para a liderança ambiental do Brasil no mundo, principalmente no ano em que o país será o anfitrião de governantes de todo o planeta para um diálogo de construção de uma economia verde e de combate às desigualdades sociais, a Rio+20.




Autor: Dal marcondes   -   Fonte: Envolverde

sexta-feira, 2 de março de 2012

Rio+20 frustra ambientalistas e especialistas


O rascunho do documento-base para a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, causou frustração entre ambientalistas e especialistas pela falta de metas claras para a sustentabilidade, que deverão ser seguidas pelos países nos próximos anos. A avaliação é do presidente do Comitê Brasileiro do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Instituto Brasil Pnuma), Haroldo Mattos Lemos.
De acordo com Lemos, o documento, divulgado em janeiro, é composto por muitas intenções e renovações de compromissos que já foram assumidos pelos países em outras ocasiões. O Draft Zero, como é conhecido o documento, reúne sugestões e contribuições de países, grupos regionais, organizações internacionais e da sociedade civil. Ele será o principal texto discutido pelos líderes mundiais na conferência e submetido à aprovação dos estados-membros da ONU na Rio+20.
“A Rio+20 está cercada de muita expectativa, mas esse documento não apresenta metas definidas para a sustentabilidade, que era o que todos nós esperávamos, e gera frustração. Ele fala sobre economia verde, criação de empregos verdes e sobre o comprometimento dos governos com o que foi decidido na Rio 92, com a Agenda 21, e em outros documentos da ONU, mas não tem metas, como o que fazer e até quando”, disse Lemos, que participou hoje (1º), no Rio, de um encontro promovido pelo Fórum Permanente de Desenvolvimento Estratégico do Estado, vinculado à Assembleia Legislativa.
Segundo ele, uma das metas esperadas era o compromisso de que os países criassem, em prazo determinado, um certo número de empregos sustentáveis, como os de alguns setores agrícolas, que usam métodos não agressivos ao meio ambiente, e os de setores ligados à energia.
Com o desenvolvimento da economia verde, haverá perda de empregos em algumas áreas, como a pesca, que usa combustíveis fósseis. “Então, uma meta que deveria ter sido incluída é a criação de empregos em áreas sustentáveis, mas não há nada nesse sentido”, lamentou.
Lemos ressaltou que, dessa forma, a sociedade civil não terá parâmetros para verificar se os governos estão fazendo o dever de casa e, de fato, desenvolvendo ações que tenham como objetivo a sustentabilidade. Para ele, a crise econômica que atinge os países europeus e os desdobramentos dela nos Estados Unidos explicam essa tentativa de “empurrar com a barriga” compromissos práticos que deveriam ser assumidos com urgência.
“A recessão na Europa é séria, e os Estados Unidos ainda tentam sair da crise. Isso influencia muito os governos a não se comprometer com metas sérias, que incluem quanto e quando. Descrente de possíveis alterações no documento até o início da conferência, em junho, Lemos alertou: “Estamos numa espécie de emergência planetária. As questões [ambientais] vão se agravar e, quanto mais demorarmos a tomar ações concretas, mais difícil e mais caro vai ser para a humanidade enfrentar esses problemas.”
Reportagem de Thais Leitão, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 02/03/2012