quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Presidência e Congresso Brasileiro podem evitar retrocesso na proteção da Amazônia


Nos últimos anos, o Brasil teve importantes conquistas em reduzir o desmatamento na Amazônia, diminuindo as taxas em torno de 80% de 2006 pra cá. No entanto, a Presidente Dilma Rousseff começa a mostrar sinais de descompromisso em relação ao meio ambiente em seu primeiro ano de mandato.

Trata-se de uma tendência que grupos ambientais têm seguido desde que Rousseff foi empossada em janeiro passado, tendência que o repórter do New York Times Alexei Barrionuevo explica bem em sua reportagem recente, “In Brazil, Fears of a Slide Back for Amazon Protection”.

Com emissões globais de desmatamento contribuindo em torno de 15% de emissões de gases de efeito estufa - o equivalente a todos os carros, caminhões, navios e aviões do mundo combinados – há muito em risco na votação de uma lei para proteção das florestas que ocorrerá mês que vem na Câmara dos Deputados.


A capacidade do Brasil, que abriga em torno de 40% das florestas tropicais remanescentes do mundo, em continuar a reduzir o desmatamento ou não, poderá depender do resultado da votação e da aprovação da Presidente Dilma Rousseff.
Reforço no Código Florestal e novas áreas protegidas reduziram o desmatamento na última década, graças a Marina Silva
A lei brasileira que regula o desmatamento em terras privadas, o Código Florestal, existe desde 1965; até recentemente, tal lei era mal cumprida e raramente obedecida.
Isso mudou durante o regime da ex-ministra do meio-ambiente Marina Silva. Em 2003, ela lançou um Plano Nacional para Prevenção e Controle de Desmatamento na Amazônia que estimulou o cumprimento da lei e estabeleceu 600.000 km² - área equivalente ao tamanho da França – de novas áreas protegidas. Tais terras indígenas, parques e reservas de terras florestais eram localizadas nas áreas mais afetadas pela expansão da agricultura.
Junto a um declínio temporário nos preços de commodities de agricultura, o Plano baixou significativamente o desmatamento e convenceu os legisladores que o Brasil poderia se compromissar com, não apenas um plano de desmatamento nacional, mas também a um plano nacional abrangente de redução de emissões.
O país firmou tal compromisso apenas em 2009, na conferência sobre o clima em Copenhagen, prometendo reduzir suas emissões de 36 a 39% abaixo das emissões esperadas até 2020 – a primeira meta de redução de emissões almejada por qualquer grande país em desenvolvimento. O Brasil se encontra à frente do planejado para cumprir sua meta de 2020, já tendo reduzido em torno de 1 bilhão de toneladas de dióxido de carbono abaixo da sua base de 1996-2005 – quando comparado ao que a União Europeia prometeu fazer para 2020.
No entanto, enquanto o plano de desmatamento deveria ter incentivos positivos para a conservação que valessem apenas perseguir, até o momento só foram apresentadas obrigações, relacionadas ao cumprimento das leis, e nenhum incentivo para manter as florestas de pé.
Agricultores contra atacam
Vista aérea do Mato Grosso mostra claras diferenças entre florestas protegidas e território que foi desmatado para criação de gado e agricultura.
Há muito tempo os poderosos agricultores do Brasil reclamam do Código Florestal, alegando ser muito restritivo. Porém, eles estavam muito ocupados cortando árvores para abrir espaço para criar gado e plantar soja para tomar alguma atitude em relação a isso. Já que o Código era raramente aplicado, não havia motivo para preocupação.
Porém, eles começaram a ter motivos para se preocupar quando o governo, durante o regime de Marina Silva, começou a aplicar o Código e distribuir multas por violações.
Os agricultores também notaram quando o grupo ambiental Greenpeace mobilizou grandes importadores de soja da Europa para declarar moratória sobre as importações de soja vindas de terras desmatadas pós-2006 e quando, em 2009, cadeias de supermercados nacionais, estimuladas pelo Procurador-Geral do Brasil, exigiam produtos não envolvidos em processos de desmatamento. A maioria da população urbana no Brasil concorda que o desmatamento da Amazônia deve ser evitado e apoiam tais medidas.
Para a maioria dos grandes agricultores do país e do seu poderoso bloco de representantes no congresso – os ruralistas – a solução para o fato de estarem desrespeitando a lei quando o governo começou a tomar medidas para, de fato, cumpri-la, foi de enfraquecê-la.
Então, nos últimos dois anos, os ruralistas têm feito um esforço conjunto para enfraquecer substancialmente o Código Florestal.
No ultimo mês de junho, os ruralistas pressionaram por um Código Florestal revisado através da Câmara dos Deputados que resultou em uma licença para desmatar. A lei, apoiada por um membro simpatizante da bancada ruralista do Partido dos Trabalhadores, consertaria o problema dos ruralistas ao fornecer anistia para desmatamentos ilegais feitos no passado e poderia abrir território novo para ser usado.
Os ambientalistas e a comunidade científica brasileira contestaram imediatamente essa lei. A Presidente Dilma Rousseffprometeu durante sua campanha presidencial vetar um novo Código Florestal que pudesse aumentar o desmatamento ou conceder anistia para desmatamentos ilegais cometidos no passado, porém, sua participação no debate realizado na Câmara foi supérfluo e ineficiente.
Em dezembro, o Senado aprovou emendas levemente melhoradas ao Código, as quais, no entanto, ainda incluem a questão da anistia para desmatamentos ilegais cometidos no passado.
Esse projeto de lei agora irá retornar à Câmara para votação definitiva em março.
A anistia pelo desmatamento que está infestando esses projetos é injusta com os novos agricultores que se esforçam para se adequarem à lei, e poderia fornecer a todos os agricultores a equivocada ideia de que se uma nova lei que concede anistia por desmatamento ilegal é aceitável, duas – ou mais, é ainda melhor. Se os agricultores pensarem que se uma concessão de anistia agora significa que desmatamentos ilegais futuros serão eventualmente anistiados também, eles tomarão o novo Código como uma licença para desmatar. Multas por violações e um caminho livre para a legalidade, reforçado por incentivos positivos, especialmente para pequenos produtores, seria uma opção muito melhor.
Os ambientalistas estão cobrando de Dilma as promessas feitas durante a campanha presidencial e o veto à concessão de anistia.
Desmatamento: o preço pelo progresso? Não exatamente
O desmatamento (linha vermelha na Fig. 1 acima) no Mato Grosso despencou conforme a produção de soja (verde) e a criação de gado (azul) aumentaram substancialmente de 2001 a 2010. (PNAS).
Por muito tempo os ruralistas têm insistido veementemente que o atual Código Florestal é um grande e injusto obstáculo para o crescimento da agricultura brasileira. (Eles também alegam regularmente que os ambientalistas que apoiam o Código Florestal são simplesmente representantes dos interesses da agricultura estrangeira tentando se proteger contra a competição vinda do Brasil).
Porém, há provas irrefutáveis que, enquanto as taxas de desmatamento estavam caindo para os seus níveis mais baixos já registrados, o Brasil e a Amazônia estavam prosperando e a produção agrícola estava crescendo a níveis jamais registrados.
Um exemplo simbólico é o maior estado agrícola do Brasil, Mato Grosso.
O estado teve o maior índice de desmatamento na Amazônia de 2000 a 2005, porém, nos cinco anos seguintes (2006 a 2010), viu o desmatamento cair em mais de 70% abaixo de seus níveis históricos. Ao mesmo tempo, a produção agrícola atingiu números inéditos, de acordo com um recente artigo publicado na Proceedings of the National Academy of Sciences. O artigoDecoupling of deforestation and soy production in the southern Amazon during the late 2000s, Márcia Macedo, Ruth DeFries e outros, mostram em grande detalhe que, em anos recentes, enquanto os preços da soja e a produção aumentaram substancialmente, o desmatamento continuou em declínio.
A retórica ruralista vai à contramão. O Brasil e o estado da Amazônia têm mostrado de forma definitiva que, até então, possuem os meios para reduzir o desmatamento de forma substancial enquanto fortalecem suas economias e o setor agrícola.
O Brasil deveria incentivar – e não minar – a ação global contra as mudanças globais
No entanto, como o New York Times corretamente aponta, as emendas ao Código Florestal ameaçam inaugurar uma temporada de caça às florestas. O governo enfraqueceu a licença ambientalista para grandes projetos de infraestrutura, como represas e estradas, e reverteu as áreas protegidas da Amazônia por meio de um decreto executivo. O Congresso Brasileiro também considera um projeto de lei que vetaria o reconhecimento de novas terras indígenas.
O Brasil abriga em torno de 40% das florestas tropicais do mundo e é um pioneiro de políticas para a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação ambiental (REDD+), as quais poderiam fornecer incentivos econômicos positivos necessários para manter o progresso Brasileiro em continuar a reduzir o desmatamento.
Algo possivelmente mais preocupante é que tem havido pouco progresso em fornecer incentivos positivos para manter o desmatamento em declínio e restaurar as florestas degradadas, algo que o Brasil precisa para sustentar o progresso feito durante a última década para o futuro.
Um candidato para incentivo é a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação ambiental (REDD) - um conceito de que reduzir o desmatamento é positivo para a atmosfera e necessita de recompensa internacional. O Brasil é um dos pioneiros dessa ideia nos debates internacionais sobre o clima, e consequentemente, criou o Fundo Amazônia, para o qual a Noruega prometeu patrocinar com $ 1 bilhão, caso o país continue a cumprir com seu objetivo de 2020.
A Política Nacional Brasileira sobre Mudanças Climáticas também clamam pela criação de um mercado brasileiro de redução de emissões. Porém, o governo federal tem feito poucos esforços em criar o seu próprio mercado de carbono e tem sido relutante em criar parcerias com mercados de carbono internacionais para pagar pela redução de desmatamento. Ambos os projetos teriam grande potencial para criar os incentivos necessários para fortalecer a economia e expandir sustentavelmente a agricultura e as florestas, ao mesmo tempo em que evitam o desmatamento e restauram as florestas degradadas.
O que isso tudo significa é que o Brasil ainda lidera o mundo em reduzir as emissões de carbono devido ao seu sucesso em reduzir o desmatamento na Amazônia – porém, arrisca reverter esse padrão caso aprove uma concessão de anistia por desmatamentos ilegais. A Presidente Dilma Rousseff deveria ouvir com cuidado à brilhante comunidade científica do Brasil sobre como equilibrar a proteção ambiental com prioridades de desenvolvimento, em relação ao Código Florestal e de maneira mais geral.
Enquanto o Brasil se prepara para sediar a Conferência Rio+20 sobre Desenvolvimento Sustentável, não terá problemas em encontrar grandes países desenvolvidos para criticar por procrastinação, omissão, ou obstrução direta à problemas ambientais globais. Novos compromissos ambiciosos sobre meio-ambiente e desenvolvimento estão estranhamente abaixo das prioridades, como a crise econômica na União Europeia e o fraco crescimento dos Estados Unidos. Culpar países mais ricos pelos desanimadores resultados é um desfecho possível.
Porém, se a Presidente Rousseff reunir a vontade política para eliminar a anistia pelo desmatamento e salvar o Código Florestal, o Brasil poderá se sair muito melhor na Rio+20. Poderá encontrar meios de usar suas notáveis realizações em reduzir emissões advindas do desmatamento para traçar o caminho para compromissos mais ambiciosos e ações mais eficientes por parte de outras grande economias para o futuro, e para criar uma estratégia de desenvolvimento sustentável de baixo carbono.
Leia artigo original no site Environmental Defense Fund




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