segunda-feira, 25 de julho de 2011

Obra de porto do governo federal pode ameaçar Encontro das Águas, no Amazonas

Área onde está prevista a construção do porto de carga também é considerada um sítio arqueológico pelo Iphan 

O Ministério Público Federal (MPF) instaurou Inquérito Civil para apurar a regularidade da construção do porto de carga em Manaus, o qual deve ser instalado no Distrito Industrial, Zona Leste, em uma área cadastrada no Instituto de Patrimônio e Histórico Nacional (Iphan) como sítio arqueológico desde a década de 70.
O órgão também determinou o prazo de dez dias, a contar de hoje (21), para que o Iphan, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e a Secretaria de Portos da Presidência da República, informem a atual fase do empreendimento (processos licitatórios, execução de projetos e autorizações), dada a “urgência” da situação.
O inquérito tem o prazo de um ano - podendo ser prorrogado por mais um - para ser concluído, informou o MPF.  Conforme o procurador da República substituto, Ricardo Perin Nardi, cabe ao Iphan analisar e autorizar a execução da obra, um passo preliminar que não foi tomado pela Secretaria de Portos da Presidência, a qual publicou a Portaria n. 174, de 26/06/2010, convocando interessados em registrar e elaborar projeto básico e estudos de empreendimento portuário a serem utilizados na concessão.
A assessoria do MPF informou que após a entrega da documentação, ela será analisada e, se constatada alguma irregularidade, tal como a previsão de obra dentro do espaço tombado como patrimônio histórico, poderá haver a recomendação para que a obra não aconteça; a solicitação de novas informações, ou, até mesmo, o início de uma ação judicial, em último caso, na tentativa de impedir a obra.
Motivação e localização
O Inquérito Civil foi motivado pela publicação de uma sequência de matérias na mídia impressa local. A área onde o porto deve ser construído é a mesma onde estava instalada a Companhia Siderúrgica da Amazônia (Siderama), próxima ao Encontro das Águas, que foi recentemente tombado pelo Iphan como Monumento Natural do Encontro das Águas dos Rios Negro e Solimões, em razão de seu elevado valor arqueológico, etnográfico e paisagístico.
Este é mais um motivo, conforme a portaria 84, de 8 de julho de 2011 (edição de hoje do Diário Oficial da União-DOU), que traz a determinação do MPF, para evitar a obra.
Conforme a portaria, a construção, planejada pelo governo Federal, de um porto de uso público, com 376 mil metros quadrados, terá como operadora a iniciativa privada, sob o regime de concessão.
Ricardo Perin destaca que a lei impede a destruição e a redução da visibilidade de patrimônios históricos. Sendo assim, o procurador entende que a localização do pretendido empreendimento privado deixa clara a inserção do porto junto ao Encontro das Águas, evidenciando a “tentativa de implantação do terminal em local em que ocorreria degradante interferência na paisagem natural, afetando indubitavelmente a leitura do fenômeno”.
Ele classifica, ainda, como lamentável que o estado do Amazonas não se atente que o Encontro das Águas terá sua paisagem natural “manchada com um empreendimento de enorme proporção, com constante e elevada atracação de embarcações de grande porte”.
Iphan aguarda projeto
Conforme a engenheira e coordenadora técnica do Iphan, Ghislaine Raposo Bacelar, já existe uma primeira solicitação feita para um levantamento arqueológico da área. Contudo, o EIA/RIMA (Estudo de Impacto Ambiental) ainda não foi entregue ao órgão, o que o impede de se manifestar a respeito.
”Estamos aguardando o projeto para avaliar a viabilidade. Temos uma idéia do local porque foi noticiado pela imprensa. Já estivemos lá fazendo uma primeira avaliação, mas não há delimitação”, explica a engenheira.
A partir do EIA/RIMA é que será possível analisar a viabilidade de se conceder a licença por parte do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), um dos responsáveis pelos demais estudos, junto ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Em seguida, haverá a consulta arqueológica, e só depois é que o projeto do porto poderá ser elaborado. Ele só será aprovado, garante a engenheira, se atender às especificações da legislação 001/86 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) - que trata do estudo de impacto ambiental e arqueologia - e a portaria 424/2010, que trata da avaliação de projetos e aprovação. Ela explica que, como não há nenhuma movimentação no local, não há prazo para a entrega dos estudos.
A Antaq informou que, como a obra não está em andamento, o processo está não é da competência da autarquia. A reportagem de acritica.com tentou contato com a Secretaria de Portos da Presidência da República, mas não obteve sucesso.

ANA CAROLINA BARBOSA

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